O Kuarup de Darcy Ribeiro
Para o antropólogo fundador da UnB, indígenas não são objeto de estudo, mas gente de existências livres e solidárias.
Texto: Thaíse Torres
Fotografia: Paulo de Araújo, Iano Andrade e Ueslei Marcelino
Acervo: Fundação Darcy Ribeiro
Recortes da mais importante cerimônia dos povos do Alto Xingu, as fotos deste ensaio são uma publicação inédita do Kuarup em homenagem ao fundador da Universidade de Brasília. Feitas em 2012, hoje as imagens celebram o centenário do antropólogo e rememoram seu legado. Darcy, presente
O ano é 2012. No Alto Xingu, indígenas Yawalapíti e povos vizinhos se unem para homenagear Darcy Ribeiro, falecido em 1997. Dança, canto, luta, celebração e reconhecimento ao etnólogo que transformou sua atividade acadêmica em convivência, admiração e respeito.
O ritual Kuarup lembra os mortos ilustres. “Estão dando amor puro e pleno, liberando a alma de Darcy do mundo terreno para os céus”, afirmou Paulo Ribeiro. O sobrinho do antropólogo, junto a outros convidados, participou da cerimônia na região amazônica.
Para tomar parte do Kuarup, o então presidente da Fundação Darcy Ribeiro passou por um processo de purificação. Seu corpo foi arranhado e coberto de padronagens em pinturas pretas, feitas com óleo de pequi e carvão, e vermelhas, de urucum. Chegava a hora de se juntar ao momento simbólico no qual os indígenas choram seus mortos para secar a tristeza e celebrar a vida.
Durante os dias de Kuarup, oferece-se biju e peixe em fartura aos convidados. É um momento de integração, boas-vindas e celebração da amizade.
A cerimônia é realizada uma vez ao ano, geralmente no início do segundo semestre. Antes, os povos viveram meses de luto, que se encerra com a última sequência de atos ritualísticos.
Após a chegada dos convidados de aldeias vizinhas, começa o corte de troncos, escolhidos dias antes para representar os homenageados. O pedaço de madeira, carpido como o corpo que ali estaria, é decorado com enfeites em meio a cantos ritualísticos.
À noite, o momento de ressurreição simbólica é marcado por emoção. Choros e cantos anunciam os primeiros raios de Sol. Então, a alma se desprende do mundo material. Faz-se uma grande roda de dança e, depois, começam as competições de luta huka huka.
Após as lutas, cada aldeia oferece produtos de sua especialidade, e o ritual encerra-se com o lançamento do tronco às águas do rio.